quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

A Final da Libertadores


Este último domingo o Corinthians foi campeão do Mundo pela segunda vez. Mas pra isso, ele antes foi campeão da América, e sobre isso tenho uma história que merece ser contada.


Nas fases finais da Libertadores, eu estava em Uganda. Não vi quartas, não vi a semi, mas a final...ah, a final não dava pra perder. Não dava.

Lá estava eu em Gulu, perto da fronteira com o Sudão do Sul. É a segunda maior cidade de Uganda. É tão enorme quanto um ovo.
A única internet que tínhamos era um pen-drive 3G. A gente geralmente colocava em um computador, que compartilhava com os outros. Não era assim tão rápido, mas, pra minha sorte, às 4 da manhã quando o jogo começasse eu certamente seria a única pessoa conectada na Grande Gulu e arredores.

Mas meu maior medo não era a internet. Era a eletricidade. Nos dias anteriores, a luz caía sistematicamente lá pelas 9 da noite. O hotel 1,78 estrelas em que estávamos tinha um gerador, mas ele era muito barulhento e desligava por volta da meia-noite.

Chegou finalmente a quarta-feira. Eu insisti pra que todos, TODOS os meus colegas carregassem seus computadores durante o dia inteiro. "O dia INTEIRO, eu preciso dessas baterias cheias, entenderam?? É muito importante!"
Anoiteceu, a luz acabou. Jantamos, bebemos umas cervejas...o gerador desligou. Tudo como esperado.
Meu amigo Lari pediu pra que eu o acordasse na hora do jogo, apesar de ser finlandês ele gostava de futebol e queria assistir o jogo comigo. Infelizmente o Lari não tinha computador...

Lá pela 1 da manhã fomos deitar. Meu colega de quarto era um dos computadorizados. "Olha aí João, a bateria tá cheia! Eu vou assistir um seriado aqui, mas fica tranquilo que a bateria dura 6 horas." Beleza...o computador era dele, quem era eu pra dizer não...mas me deu um medinho. Deu sim. Dormi.


O meu celular tinha um despertador falante. "The - time - is - three - forty five - it's time to wake up." Levantei num pulo. Olhei pro lado...Meu amigo tinha dormido. E foi aí que senti o soco no estômago. O computador ficou ligado. "Ai baralho.". 1 hora de bateria. "BARALHO!". Peguei o laptop e corri pro quarto do Lari. "Cara, LEVANTA! Tá na hora do jogo. Mas você não vai ver. Você vai acordar todo mundo e arranjar um computador!"


Montei o notebook moribundo na varanda do hotel. Escuridão total e absoluta. Momentos de ansiedade, enfia o 3G, conecta, canaistv.net, rede globo, fecha propaganda, fecha, fecha...
Até que finalmente, ali na minha frente, o tão sonhado jogo. Deu tempo! Deu tempo... Mas a bateria...olha, não sei qual é o problema da Apple e seus macfagcomputers, mas só de abrir o jogo eu tinha mais 40 minutos, e a bola ainda nem tinha rolado. Não ia dar nem pro primeiro tempo.

Ainda demorou uns 10 minutos pro Lari voltar, não com um, mas DOIS computadores. É um santo, o Lari. Ele insistiu muito pra acordar as meninas, e meio de má vontade elas emprestaram os computadores...Caramba. Eu tinha pedido tanto. "Mas que se dane, eu perco a amizade mas não perco esse jogo."
O jogo foi rolando, a bateria acabando...o brilho da tela diminuindo...já deixamos o segundo computador aberto do lado. Falta de ataque. Jogador caído. "É agora!", arranca o 3G, enfia no novo, conecta, canaistv.net, rede globo, fecha propaganda, fecha, fecha... uns dois minutos que em final de Libertadores são uma eternidade. Na minha mente já tinham saído uns quarenta gols e eu tinha perdido todos.

Voltou. Tava zero a zero ainda. Ufa.
E a bateria? Ahh, a bateria...a bateria tinha mais 30 minutos. Cacilda.

Pelo menos dava pra acabar o primeiro tempo. No intervalo trocamos com calma, tínhamos mais 3 horas de bateria, tudo certo. Computador estava resolvido...mas o jogo não. Ah, não.


Olha, no primeiro gol, eu ainda me controlei. Naquele silêncio das cinco e meia, que de tão denso dava quase pra agarrar nas mãos, eu soltei um "Gol!" que parou a meio metro do meu nariz.
Mas o Boca é marrento, não tinha nada decidido, jogo nervoso... Mas aí o Emerson roubou a bola no meio-campo. E aí o Emerson correu em direção à área. Aí o Emerson ficou cara a cara com o goleiro, e aí e aí...e aí, caramba, e aí é GOL!
Gol não, é GOOOOOLLL é gol GOL GOL!!!

Segundo meu amigo, acordei uma criança Sudão. O Sudão e Gulu inteira. Que se dane. É campeão. É o fim, acabou. É Corinthians, é nóis, e vai pra ponte que caiu, vai curintia.



Não dormi. Umas duas horas depois do fim do jogo, eu estava numa escola, ainda um pouco bêbado ajudando a instalar um painel solar. Fui precavido e não subi no telhado, mas isso quis dizer que eu tive que ficar logo abaixo dele, botando as porcas nos parafusos. Ficar com a cara enfiada na telha de zinco é ficar com a cara num forno assando bolo de fubá. Mas isso é outra história. A América agora era corinthiana. A América, e Gulu.

2 comentários:

  1. Não sou corinthiana mas ri muito e me diverti com a sua emoção e a confusão armada em Uganda. Minha prima morou no Sudão do Sul, me contou muitas coisas sobre como era quando queria ver um jogo. hehehe
    E a final do mundial? foi mais tranquila para você?

    ResponderExcluir
  2. Agora eu vi sua Libertadores em Gulu!
    Adorei, João! Cê escreve bem demais! (:

    Beijo!

    ResponderExcluir